quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

Poema a Luís de Camões | Rosalia de Castro











Desde as fartas ribeiras do Mondego,

desde a Fonte das Lágrimas,
que na bela Coimbra,

as rosas de cem folhas embalsamam,
do Minho atravessando as águas mansas
em misteriosas asas,

de Inês de Castro, a dona mais garrida,

e a mais doce e mais triste enamorada,

do grão Camões que imortal a fez

cantando as suas desgraças,

de quando em quando a acarinhar-nos vêm

eu não sei que saudades e lembranças.

Lá deu seu fruto a planta abençoada
com sem igual pujança.
Daqui o germen saiu, sabe-o Lantanho

e a sua torre dos tempos afrontada.
Talvez por isso - ó desditosos - sempre
convosco foi o germen da desgraça:

Tu, pobre dona Inês, mártir do amor
e tu Camões da inveja empeçonhada.

Pesam dos génios na existência dura

Tanto a fama e as glórias quanto as lágrimas.


A que cantaste em peregrinos versos,
morreu baixo o poder de mãos tiranas.

Tu acabaste olvidado e na miséria
e hoje es glória da altiva Lusitânia,

ó poeta imortal, em cujas veias

nobre sangue galego fermentava!


Esta lembrança doce,

envolta numa lágrima,

manda-te desde a terra

onde os teus foram nados
uma alma dos teus versos namorada


CASTRO, Rosalia de. - Antologia Poética. Colecção Poesia e Verdade, 1885, Guimarães Editores, pág 11-12

Sem comentários: